quarta-feira, 1 de outubro de 2008

O ROMÂNICO, a ROTA do ROMÂNICO e a IGREJA de S. PEDRO de ABRAGÃO


Ao longo dos últimos meses foi colocada, em Abragão, sinalética relativa à Rota do Românico (confundida por vezes com romântico...), igual à que aparece na galeria acima. Esse aspecto motivou alguma curiosidade em todos nós uma vez que não estávamos/estamos devidamente enquadrados com o significado das mesmas. Assim sendo, propomos dar aqui um contributo para que se perceba melhor o que constitui essa sinalética e o que representa.

Contudo, antes de fazer qualquer referencia à Rota do Românico importa pois esclarecer, de forma simples e concisa, o que é o Românico enquanto estilo artístico e, neste caso, sobretudo arquitectónico.

O Românico constitui um “movimento” artístico que se impôs na Europa, sobretudo entre os séculos XI e XIII, e se assumiu como o primeiro estilo capaz de manter traços característicos comuns a várias regiões dando à arte a unidade que esta perdeu com a fragmentação que a queda do império romano lhe causou. Esse estilo manifestou-se sobretudo na Arquitectura (aspecto que mais nos interessa), na Pintura e na Escultura.

De forma abreviada e simples, a Arquitectura do período românico assenta nestes princípios:

" - Construções pesadas e articuladas de alvenaria(pedra);
- Aberturas estreitas;
- Uso do arco circular e da abóbada cilíndrica (de berso);
- Desenvolvimento da abóbada de nervuras e do pilar de abóbada; e
- Introdução das torres central e ocidental nas igrejas. " (Ching, Francis - Dicionário Visual de Arquitectura)

Sendo que o movimento se expandiu de forma enérgica pela Europa, a sua chegada a Portugal, nomeadamente à zona Norte, foi inevitável, sendo que o Vale do Sousa alberga um numero significativo de edifícios deste período. Deste modo, percebendo a riqueza e a importância desse património a Comissão de Coordenação do Desenvolvimento Regional do Norte (CCDRN) definiu a Rota do Românico como projecto âncora da Área de Intervenção de Base Territorial com o objectivo de valorizar esse mesmo património e mostrar o seu potencial cultural e turístico (ver www.rotadoromanico.com).

Assim, chegamos pois ao ponto que mais nos interessa, um desses edifícios acima referidos é a Igreja de Abragão, Monumento Nacional pelo decreto 129/77, DR 226, de 29-09-1977. De facto, a nossa igreja está carregada de significado arquitectónico sendo um edifício “importante para a caracterização do Românico do Douro Litoral do segundo quartel do século XIII" (ver www.ippar.pt). Não se pense, no entanto, que a nossa igreja como a conhecemos é românica no seu todo porque não é. Ao longo das transformações a que foi sujeita, desde a data da sua construção, a nossa igreja perdeu um pouco da sua identidade arquitectónica e, sobretudo, “pureza” românica (1). Assim, da parte românica (2) , e de maior valor patrimonial, resta apenas a cabeceira, ou seja, o altar da igreja como ela existe hoje (dos mais bonitos de todas as igrejas que conheço…). No entanto, apesar do pouco que resta da construção românica original, são vários os pormenores arquitectónicos e escultóricos (adequados à arquitectura) que conferem à nossa igreja um valor muito significativo.

Não vamos fazer aqui uma descrição pormenorizada de todos os elementos românicos de destaque (3), mas elementos como a capela mor (altar) enquanto conjunto e, de forma separada, os seus capiteis, o seu arco levemente quebrado, as suas pinturas murais, os frisos, os cachorros, as janelas estreitas, etc., merecem que a nossa igreja seja vista para além do que significa como espaço de culto que também é. Até porque em termos de espaço de culto há coisas que devem ser revistas… mas isso fica para um próximo capítulo.

(1) CRONOLOGIA das obras de edificação (não são referidas as obras de conservação):
- Edificação original, já desaparecida séc. XI/XII;
- Edificação românica séc. XIII;
- Reconstrução da nave séc. XVII (1668); e
- Edificação da torre sineira séc. XIX (1820).

(2) A construção original, da qual resta apenas a cabeceira, foi mandada construir por D. Mafalda, filha de D. Sancho I, no segundo quartel do século XIII.

(3) Foi publicado pelo Museu Municipal de Penafiel, neste mês de Setembro, um pequeno livro, que se lê em 5 mins, sobre a igreja de Abragão e que refere pormenorizadamente estes e outros aspectos (como as pedras descobertas na “Casa do Ferreiro”).


FNA | Mateus Oliveira

2 comentários:

Anónimo disse...

Em primeiro lugar, gostaria de felicitar todos os envolvidos nesta iniciativa, pela forma e pelos assuntos que estão a aboradar. Devo dizer, que para mim, como abragonense, é de facto muito interessante poder ter acesso a leituras tão elaboradas e com tanto conteúdo sobre uma terra que em termos de beleza e riqueza, nos passa completamente ao lado, a nós, os habitantes dela (por incrível que pareça).
Fiquei bastante mais elucidado ao ler este texto, porque devo confessar, estava um pouco desinformado relativamente à rota do românico no seu conjunto, quer as sinalizações da mesma, quer o que de românico tem esta terra e portanto fiquei MUITO mais informado sobre um assunto que deveria ser de intereese geral pela riqueza cultural que implica.

Espero que continuem a poder escrever e demostrar situações como esta, que a mim tinham passado bastante ao lado e principalmente que continuem a cultivar o gosto por esta terra tão linda.

Jorge L.

Anónimo disse...

Oportuno esclarecimento e agradável explicação de história de arte.
De facto, o românico do Norte de Portugal é de uma beleza ímpar, sobretudo pelas pequenas construções que se encontram perfeitamente encaixadas na natureza e meio rural, quase dando a sensação que estão ali perdidas.
Cabe-nos conhecer e... preservar!

Parabéns pelo sentido de oportunidade, divulgação da cultura e promoção dos valores regionais!

Miguel Santos